Relatório do IPEA registra avanços na cobertura e na qualidade da oferta dos serviços de acolhimento institucional para crianças e adolescentes
Documento é o primeiro produto da avaliação do Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária
Foto: Ana Nascimento/Min. Cidadania |
O serviço de acolhimento institucional para crianças e adolescentes, que faz parte do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) do Governo Federal, registrou grandes avanços nos últimos anos. É o que revela o relatório Trajetória dos serviços de acolhimento para crianças e adolescentes, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Além de um aumento de 16% no número de instituições em todo o país, agora os serviços estão mais interiorizados, ofertados em locais de menor porte e para grupos reduzidos.
O relatório é o primeiro produto da avaliação do Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (PNCFC) e foi apresentado na última segunda-feira (26.10) em uma reunião conjunta entre a Comissão de Políticas do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e a Comissão de Políticas do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). O estudo utilizou como base de dados o Censo SUAS e pesquisas sobre serviços de acolhimento realizadas anteriormente pelo IPEA e pela Fiocruz.
"O estudo é resultado da convergência de esforços entre os atores do Governo Federal e o IPEA, trazendo mais uma contribuição histórica desse Instituto para o avanço das políticas voltadas à promoção do direito à convivência familiar e comunitária e ao aprimoramento dos serviços de acolhimento para crianças e adolescentes", comenta a secretária nacional de Assistência Social (SNAS) do Ministério da Cidadania, Mariana Neris. "Sua realização foi possível graças à parceria com o IPEA e à disponibilização dos dados do Censo SUAS, que é o principal instrumento de materialização do papel da vigilância socioassistencial no monitoramento da rede socioassistencial, coordenado pelo Ministério da Cidadania”, completa.
De acordo com o levantamento, em 2010 havia 2.624 instituições de acolhimento institucional de crianças e adolescentes no Brasil. Os dados mais recentes são de 2018 e mostram que esse número subiu para 2.877. Se por um lado houve a ampliação da oferta dos serviços, por outro foi constatada uma redução no número de vagas. Segundo a análise, isso significa que as novas instituições cumprem a orientação de acolher uma quantidade reduzida de crianças e de adolescentes por unidade, o que permite uma atenção mais individualizada e de melhor qualidade. Em 2010, eram 52.587 vagas, enquanto o dado mais recente é de 50.646.
"Essas crianças e esses adolescentes são afastados das suas famílias porque sofreram situações de violência, abandono ou negligência. Então, são afastados e acolhidos temporariamente nos serviços de acolhimento", explica Enid Rocha, pesquisadora do IPEA e responsável pelo estudo, que contou, ainda, com o trabalho dos pesquisadores Elaine Lício, Marco Natalino, Aline Amaral e da bolsista Marina Brito.
"Nesse período, ela precisa ficar em uma instituição que acolha um pequeno número de crianças, que funcione como uma família. Não se pode massificar o atendimento. A instituição precisa ser bem articulada no município. A criança e o adolescente precisam, por exemplo, frequentar a escola e o centro de saúde e todos os serviços disponíveis na comunidade. E todo esforço tem que ser feito para apoiar também a família, que muitas vezes não tinha condições de proporcionar esses cuidados. Então a política tem que olhar para a criança e o adolescente e para a família, o que não acontecia antes", destaca Enid.
Avanços
O Brasil tem hoje 33 mil acolhidos pelos serviços institucionais e familiares. A legislação recomenda que o período de permanência nos serviços de acolhimento institucional seja de até 18 meses, até que a criança ou adolescente possa retornar para a família de origem, ficar com outro parente ou, em último caso, ser encaminhado para adoção. Em 2010, 30,4% estavam abrigados nesses serviços por mais de dois anos. Agora, o percentual caiu para 22,5%.
"Quanto mais tempo eles permanecem na instituição, mais problemas poderão ter em relação ao sentimento de pertencimento familiar e social porque o direito à convivência familiar não está sendo vivenciado. A longa permanência é muito prejudicial para o desenvolvimento", avalia a pesquisadora. "No período analisado pelo relatório, a política de acolhimento teve muitos avanços. Eles se devem à expansão e à ampliação da política nacional de Assistência Social, que avançou muito nos municípios com o SUAS e a instalação dos CRAS e dos CREAS", acrescenta.
Outro indicador revelou a incidência de acolhidos a cada 100 mil habitantes. Em 2010, a taxa era de 65,6, enquanto na pesquisa mais recente foi de 59,1, uma queda de 9,9% em dados nacionais. A maior taxa é a da região Sul (107,1). Já a região Norte foi a que apresentou o maior crescimento na oferta dos serviços de acolhimento (51,4%), mas ainda é a que apresenta a menor cobertura.
Em dados por unidade de acolhimento, também foi identificada uma redução significativa na média de acolhidos. Em 2010, eram 15,2 crianças e adolescentes por unidade, enquanto atualmente a média caiu para 10,6, o que indica que as instituições estão conseguindo atender grupos menores. As normativas do SUAS em vigor indicam o atendimento de, no máximo, 20 acolhidos por unidade. Em 2010, 25,7% das unidades atendiam acima da capacidade recomendada, enquanto hoje o número caiu para 11,9%.
O relatório do IPEA mostrou ainda que, ao contrário de pesquisas anteriores, desta vez foi constatado, entre adolescentes a partir de 12 anos, um maior número de meninas do que de meninos. Outro dado evidenciou a importância e os avanços da articulação institucional com os Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS). Todos os tipos de articulação, como reuniões periódicas, troca de informações, estudos de caso em conjunto e atividades em parceria, tiveram aumento constatado nos últimos anos.
"Esses dados demonstram que houve uma evolução muito importante no número de serviços de acolhimento que fazem ações articuladas com os CREAS", explica Enid Rocha. "Já foi provado que esse trabalho em rede tem capacidade de abreviar o tempo de permanência do acolhimento, dando mais chance de retorno para a família de origem ou encaminhamento para adoção mais rapidamente", acrescenta.
Desafios
Além dos avanços registrados, o relatório do IPEA também apontou os principais desafios que os serviços de acolhimento ainda enfrentam. Um deles é relacionado à cobertura nacional: hoje, 2.010 municípios brasileiros, onde vivem 80,3% da população, têm a oferta dos serviços de acolhimento de crianças e adolescentes, enquanto 3.560 municípios de pequeno porte não oferecem o atendimento.
Outro desafio levantado pelo relatório diz respeito à idade dos acolhidos. Apesar de as unidades serem destinadas a crianças e adolescentes de 0 a 17 anos, foram identificados 1.267 (4%) acolhidos com mais de 18 anos, sendo 538 deles com idades entre 18 e 21 anos, faixa etária que deveria ser atendida pelas Repúblicas.
A pesquisa mostrou, contudo, que apenas 19 municípios em todo o país ofertam serviços de acolhimento em repúblicas. No total, são 30 serviços distribuídos em nove estados, de três regiões. Além disso, das 244 vagas existentes, 152 apareciam ocupadas.
Dessa forma, o estudo destacou a necessidade de ampliação do serviço de Repúblicas para jovens de até 21 anos e, ainda, a importância da capacitação profissional, além de atividades como apoio socioemocional, de apoio às famílias e de acompanhamento escolar, a fim de que eles consigam alcançar a autonomia financeira até o momento de deixarem as instituições.
O relatório também apontou que a oferta de Serviços de Acolhimento Familiar ainda é pequena no país e muito aquém do que preconiza a legislação. Segundo a lei, quando a medida protetiva de acolhimento é necessária, deve-se priorizar o encaminhamento para o acolhimento familiar.
“O estudo mostra de forma contundente onde avançamos e onde precisamos centrar nossos esforços a partir de agora. Dentre outros aspectos, evidencia a necessidade de avançarmos na oferta dos Serviços de Acolhimento em Famílias Acolhedoras, no suporte aos adolescentes em serviços de acolhimento e na construção de políticas mais efetivas para os jovens egressos desses serviços”, destaca Juliana Fernandes, assessora da SNAS.
Passado e futuro
A avaliação do PNCFC é um projeto coordenado pela Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS) do Ministério da Cidadania e pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (SNDCA) do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), com o apoio da Secretaria Nacional da Família (MMFDH) e de diversos parceiros. Além do estudo conduzido pelo IPEA, outras pesquisas estão em curso, por meio de outras parcerias. Todos os resultados da avaliação serão apresentados ao Conanda e ao CNAS como subsídios para a atualização do Plano Nacional.
"A reunião conjunta representou o início desse processo de avaliação, que deve ser concluído no fim do primeiro semestre de 2021. A proposta é que, a partir do que for identificado na avaliação, a gente possa construir ações que de fato venham superar os desafios", aponta Célia Maria Lima, coordenadora da Comissão de Políticas do CNAS e representante do Fórum Nacional de Secretários (as) de Estado da Assistência Social (FONSEAS) do Distrito Federal.
Aprovado em 2006, o PNCFC foi a primeira resolução conjunta da história dos dois conselhos, e apresentou ações a serem implementadas até 2015. O documento reafirma direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), como políticas de apoio à família e prevenção do afastamento do convívio familiar, qualificação do atendimento nos serviços de acolhimento e adoção focada no direito da criança e do adolescente, entre outros.
"O monitoramento é importante por produzir informação qualificada sobre o acolhimento institucional de crianças e adolescentes que pode auxiliar no planejamento e aprimoramento dessa política", afirma a presidente do Conanda, Iolete Ribeiro. "Os dados levantados pelo IPEA demonstram a importância da ampliação do orçamento público destinado diretamente para essa política, mas também apontam para a necessidade de apoio às famílias em situação de vulnerabilidade, para que o acolhimento institucional cumpra, de fato, os princípios da excepcionalidade e provisoriedade", completa.
Diretoria de Comunicação - Ministério da Cidadania
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